Quando eu ainda
era criança, ouvia falar no temor que tinham os pescadores das comunidades de
Piracaba e Periquito(atual Santa Cruz) em encontrar um grupo de homens armados da comunidade de Curicaca que tinham o intuito
de afugentar àqueles que adentrassem o rio Maicuru para esticar suas redes em
busca de peixes “melhores’. Este grupo de homens saia de suas casas com o
objetivo de patrulhar o rio Maicuru até sua foz, no lago grande de Monte
Alegre, no Estado do Pará.
Muitas histórias
estão ligadas à preservação do rio Maicuru(do Curicaca para baixo), entre elas:
dois assassinatos, inúmeras agressões físicas e verbais, juras de morte e muita
especulação e medo tanto por parte dos pescadores e suas redes que insistem em
invadir o rio para pescar quanto por parte dos comunitários de Curicaca que não
sabem o que ou quem os aguardam a cada patrulha.
Não se sabe ao
certo quando começou e sequer sabe-se quem foi o mentor das patrulhas organizadas
por homens armados com espingardas, revólveres e facões. O que se sabe é que
essa iniciativa funcionou por bastante tempo, os pescadores das comunidades
vizinhas que tradicionalmente pescam com redes tinham um certo medo em estica-las
no rio que era rico em “peixes graúdos” como pirarucu,tambaqui, surubim, entre
outros.
Quando a
patrulha que era composta por até vinte homens divididos em várias canoas
encontrava alguém pescando com redes, que aqui são chamadas de “malhadeiras”,
eles tomavam as redes, se o pescador tivesse arma, esta também era apreendida e
de vez em quando(quase todas as vezes) o pescador era agredido fisicamente e
sofria ameaças diversas. A confusão estava feita.
No fim dos anos 80, a primeira morte ligada à
essa disputa, o então líder do pessoal que preservava, Henrique de Cristo foi
assassinado numa “tocaia” quando voltava do cemitério no dia 2 de novembro,
levando um tiro nas costas disparado por um indivíduo de codinome “caçarola”. A
morte do líder estremeceu em parte o movimento de preservação, jogando uma
nuvem de desconfiança e medo no restante do grupo.
Foi apontado
como mandante do crime um pescador da comunidade de Piracaba que ficou preso
por alguns dias, mas absolvido por falta de provas. Quanto ao assassino,
cumpriu alguns anos da pena e posto em liberdade, porém numa noite escura,
quando voltava de uma caçada, foi assassinado com golpes de facão e semi-esquartejado, o(s)
assassino(s) nunca foram localizados, alguém foi preso acusado de participação,
mas liberado por falta de provas.
Hoje, o
movimento de preservação está enfraquecido e “ apenas algumas famílias
preservam a vontade de ver o rio e seus peixes protegidos, outros se deixaram
seduzir pela “malhadeira” e a usam no rio (escondido, é claro), pois é mais
fácil e mais rápido de apanhar os peixes do que o arpão e a tarrafa”, afirma
Juarez de Jesus, filho do lugar e funcionário do Sindicato dos Trabalhadores
Rurais do Município.
A situação da
comunidade de Curicaca que tentou à sua maneira manter seu meio ambiente preservado para as futuras
gerações, mostra a vontade de um povo em preservar a natureza em que vive e de
que depende, mostra também que a união de um grupo em torno de um objetivo
comum traz resultados eficazes. Pessoas tombaram no meio da jornada, mas de
alguma forma, serviram de combustível para que os demais continuassem o sonho.
É claro que o
método utilizado pelos moradores de Curicaca não é legal, não é adequado, não é
o correto para se lidar como este tipo de situação, mas foi a maneira que eles
encontraram para manter equilibrado o meio ambiente ao redor do lugarejo. É
claro que existem outras mil opções de preservação com ajuda dos órgãos de preservação
da natureza, como ONGs, organismos do Estado, associações, etc. que poderiam
dar suporte aos comunitários para que estes deixassem de usar as armas e dessa
forma parassem de fazer a preservação à bala.
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